Técnica desenvolvida por grupos da Unesp e colaboradores espanhóis evita que o efeito antienvelhecimento proporcionado pelas vitaminas C e B3 seja diminuído após contato do produto com o ar ou a radiação solar (imagem: Leonardo Delello Di Filippo/Unesp)
Publicado em 04/11/2022
Thais Szegö | Agência FAPESP – Pesquisadores da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e da Universidade de Valência, na Espanha, desenvolveram micropartículas com substâncias antioxidantes capazes de combater o envelhecimento precoce da pele e de permanecer estáveis mesmo em contato com o oxigênio ou a luz solar. O sistema produzido tem como objetivo prolongar a entrega desses ativos para a pele, proporcionando um maior tempo de ação.
No estudo, divulgado na revista científica Life, os pesquisadores trabalharam com o ácido ascórbico (vitamina C) e a nicotinamida (vitamina B3). As duas substâncias são conhecidas por seus efeitos protetores contra danos causados por poluição, radiação ultravioleta e radicais livres. Ambas estimulam a síntese de colágeno, protegem contra o fotoenvelhecimento induzido pelo sol e têm forte ação despigmentante, ou seja, eliminam manchas. Além disso, a vitamina B3 ainda combate processos inflamatórios e a produção de sebo, por isso é muito bem-vinda no tratamento de acne e rosácea.
No entanto, essas moléculas são bastante instáveis e se degradam facilmente quando há alterações de pH, temperatura, exposição à luz solar, água ou ao oxigênio, o que faz com que seja um desafio sua utilização na formulação de cosméticos.
Contornar essa questão foi o foco do trabalho, que recebeu financiamento da FAPESP por meio de cinco projetos (15/19097-0, 16/20957-6, 15/02619-3, 20/16573-3 e 19/25125-7). Para isso, os cientistas lançaram mão da quitosana, composto extraído do exoesqueleto de crustáceos que serve de compartimento protetor para os ativos, ajudando a prevenir a oxidação prematura dos antioxidantes, e ainda tem propriedades antimicrobianas, o que é muito interessante no uso de produtos para o tratamento da pele.
“Para produzir as micropartículas, adicionamos um solvente capaz de misturar as substâncias, no caso o etanol. Em seguida, utilizamos um processo chamado secagem por spray dryer, que basicamente é um secador enorme com condições de temperatura e pressão controladas para secar o solvente originando um pó alaranjado composto pelas partículas bioativas”, explica Leonardo Delello Di Filippo, doutorando na Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Araraquara (FCFAr-Unesp) e primeiro autor do trabalho.
Durante o procedimento, foram adicionados ainda outros materiais com o objetivo de oferecer maior uniformidade à superfície das partículas, tornando a liberação dos ativos mais regular e previsível. Cria-se, dessa forma, um sistema de estocagem capaz de reter controladamente a liberação gradual dessas substâncias, permitindo maior tempo de contato com a pele.
“Podemos fazer uma analogia com uma viagem de carro, se a estrada for toda esburacada, a chance de acontecer um acidente é maior, mas se ela for lisinha, como ficou a superfície das partículas, tudo corre melhor”, compara Di Filippo.
Testes pré-clínicos
O passo seguinte foi testá-las. Para isso foram utilizados modelos laboratoriais in vitro e pele de orelha de porco, que tem tipos de células, estrutura e espessura muito parecidas com a pele humana. Os dois processos se complementaram e comprovaram que as micropartículas obtidas pelos cientistas conseguiram prolongar a ação dos ativos na pele por causa da liberação controlada dos ativos, apresentaram ação antibacteriana, ajudando a proteger as camadas do tecido se elas estiverem comprometidas por alguma contaminação e ainda foram capazes de ajudar na sua própria conservação.
Além de todos os benefícios oferecidos à formulação dos produtos para a pele, a técnica utilizada na produção das micropartículas tem a vantagem de ser facilmente reprodutível e escalonável na indústria. “Trata-se de um produto multiuso com valor agregado por ter uma tecnologia diferenciada e por todas essas razões a sua utilização na fabricação de cosméticos é um sonho cada vez mais real”, diz Di Filippo.
De acordo com Marcos Antonio Corrêa, professor do Departamento de Fármacos e Medicamentos da FCFAr-Unesp e orientador de Di Filippo, a próxima etapa envolve a produção das micropartículas em escala industrial, de modo a permitir que as empresas fabricantes de cosméticos tenham acesso a essa tecnologia. “O grupo de pesquisa já foi contatado por empresa interessada e as negociações estão em andamento”, revela.
O artigo In Vitro Skin Co-Delivery and Antibacterial Properties of Chitosan-Based Microparticles Containing Ascorbic Acid and Nicotinamide pode ser lido em: www.mdpi.com/2075-1729/12/7/1049/htm.