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Descoberta de mecanismo envolvido em inflamação dentária abre caminho para terapias contra perda óssea


Descoberta de mecanismo envolvido em inflamação dentária abre caminho para terapias contra perda óssea

Luciano Aparecido de Almeida Júnior, primeiro autor do artigo, analisa imagem da pesquisa no laboratório do grupo (foto: Francisco Wanderley Garcia de Paula-Silva/USP)

Publicado em 25/09/2023

Luciana Constantino | Agência FAPESP – Por meio de experimentos com camundongos, pesquisadores desvendaram mecanismos envolvidos em inflamações na polpa dentária e em lesões periapicais (em torno da extremidade da raiz do dente), abrindo caminho para a busca de medicamentos que podem ser usados para inibir a perda óssea decorrente de infecção endodôntica. O mecanismo estudado envolve um receptor denominado TNFR1, no qual a citocina pró-inflamatória TNF-α se liga.

Em uma das situações avaliadas, a via de sinalização TNF-α-TNFR1 foi capaz de proteger e permitiu o reparo do dente, mas, em outro caso, gerou resposta em sentido diferente, levando a um processo inflamatório com perda óssea – a diferença foi a presença ou não de microrganismos.

Um dos estudos, publicado no Journal of Endodontics, mostrou que o receptor TNFR1 está envolvido na formação de dentina reparadora após a realização do chamado “capeamento” da polpa dentária, ou seja, a colocação de um material bioativo diretamente sobre o local exposto na tentativa de permitir a cicatrização da polpa.

Quando o TNFR1 é removido ou desativado geneticamente (processo conhecido como ablação), há uma alteração da resposta inflamatória e inibição da produção de proteínas-chave de mineralização (sialoproteína dentinária e osteopontina), levando à necrose da polpa dentária e ao desenvolvimento de periodontite apical. Com isso, os pesquisadores demonstraram, in vivo, que essa via de sinalização pró-inflamatória é importante para a diferenciação celular e síntese de proteínas que controlam o processo de biomineralização dentária – um caminho crucial para a cicatrização adequada dos dentes.

Já no outro trabalho, publicado na mesma revista, os cientistas observaram que a via de sinalização TNF-α-TNFR1 é responsável por mediar a degradação do tecido ósseo após a contaminação do canal radicular. Essa via desempenha um papel importante na inflamação e na perda óssea quando o canal radicular do dente está contaminado por microrganismos. Se houver o bloqueio dela, é possível reduzir os efeitos negativos.

“Nosso grupo tem trabalhado na investigação de mediadores biológicos envolvidos na diferenciação de células-tronco e biomineralização de dentes e ossos. Estudamos lesões periapicais, que são um tipo bem específico, quando há entrada de bactérias no canal radicular dos dentes, resultando em uma contaminação no canal”, afirma o professor da Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FORP-USP) Francisco Wanderley Garcia de Paula-Silva.

Os dois artigos são resultado do doutorado de Luciano Aparecido de Almeida Júnior no Programa de Pós-Graduação em Odontopediatria da FORP-USP, sob orientação de Paula-Silva. Ambos receberam apoio da FAPESP (19/00204-1 e 19/02432-1).

Recentemente, o grupo ligado ao professor também publicou um artigo direcionado e revisado por crianças para explicar o processo de regeneração dos dentes, com ênfase nas células e moléculas envolvidas neste mecanismo. Além disso, eles mantêm um canal no YouTube sobre “alfabetização” em saúde bucal (leia mais em: agencia.fapesp.br/41826).

Entre crianças e adolescentes, as cáries são o principal problema bucal, segundo dados preliminares da Pesquisa Nacional de Saúde Bucal, que vem sendo realizada pelo governo federal. O levantamento mostra ainda que cerca de 45% dos idosos de 65 a 74 anos precisam de algum tipo de tratamento imediato, devido à dor ou infecção dentária, e, entre adultos (de 35 a 44 anos), foi identificada a necessidade de ao menos um procedimento odontológico eletivo em 48% da população avaliada.

Passos

Na pesquisa que envolveu a formação de dentina reparadora, os cientistas compararam as respostas de reparo da polpa dentária de camundongos geneticamente deficientes do receptor-1 de TNF-α com roedores “selvagens” (linhagem C57Bl6). O capeamento da polpa foi realizado com agregado de trióxido mineral. Após sete e 70 dias, os tecidos foram coletados para avaliação.

Nessa situação (falta do receptor TNFR1), a resposta inflamatória gerada foi muito grande, resultando na perda óssea com recrutamento de células que fazem essa reabsorção do tecido.

No estudo que avaliou a via de sinalização TNF-α-TNFR1 frente à infecção, os pesquisadores induziram a periodontite apical por meio da inoculação de microrganismos orais nos canais radiculares de molares dos camundongos e compararam com o grupo de controle após sete, 14, 28 e 42 dias.

Foram realizadas análises por microtomografia computadorizada – com a participação do Laboratório de Pesquisa em Endodontia da FORP-USP –, avaliação histopatológica, histomicrobiológica e histométrica. A conclusão foi de que os roedores deficientes de TNFR1 exibiram menor recrutamento de neutrófilos aos 14, 28 e 42 dias, resultando em diminuição da área e do volume da periodontite apical aos 42 dias.

O número de osteoclastos – células responsáveis pela reabsorção óssea por meio da desmineralização e degradação da matriz do osso – também foi menor nestes animais aos 14 e 42 dias.

Paula-Silva diz que seu grupo vem agora buscando perspectivas terapêuticas com base nos achados das duas pesquisas. “Com esses resultados, percebemos que, se bloquearmos essa resposta inflamatória, inibindo o receptor, podemos trabalhar em um protocolo de tratamento. Estamos na fase inicial, ainda em modelo animal, mas é um alvo bem interessante”, complementa o professor em entrevista à Agência FAPESP.

Os artigos Reparative Dentin Formation Following Dental Pulp Capping is Mediated by TNFR1 In Vivo e TNF-α-TNFR1 Signaling Mediates Inflammation and Bone Resorption in Apical Periodontitis podem ser lidos, respectivamente, em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/37423584/ e https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/37499863/.
 

Fonte: https://agencia.fapesp.br/44930