Pesquisadores ligados ao Centro de Inovação em Novas Energias estudam tecnologias emergentes que podem viabilizar dispositivos com maior capacidade de armazenamento energético e menor impacto ambiental (imagem: CINE/divulgação)
Publicado em 20/06/2022
Agência FAPESP* – Entre os dispositivos usados para armazenar energia, os supercapacitores se destacam pela potência (a rapidez com que conseguem carregar e entregar energia) e vida útil (a quantidade de ciclos de carga e descarga que podem oferecer). Contudo, eles são limitados quanto à densidade energética, que é a quantidade de energia que um dispositivo é capaz de armazenar em determinado volume ou peso. Nesse quesito, as baterias são melhores, mas elas perdem em termos de potência. Dessa forma, baterias e supercapacitores podem se complementar em uma aplicação.
Dois trabalhos recentes conduzidos por pesquisadores ligados ao Centro de Inovação em Novas Energias (CINE) avançam a compreensão de tecnologias emergentes que podem viabilizar supercapacitores com maior densidade de energia e menor impacto ambiental. Em ambas as pesquisas, os autores estudaram supercapacitores com eletrólitos não convencionais, os de líquidos iônicos e os de água em sal.
O eletrólito é o componente do supercapacitor, geralmente líquido, que fica confinado entre os eletrodos. Quando uma tensão elétrica é aplicada no dispositivo (ou seja, quando o supercapacitor é ligado na tomada), os eletrodos polarizam, adquirindo carga positiva e negativa, respectivamente. Nesse momento, uma camada de íons de carga oposta passa a aderir à superfície de cada eletrodo e, na interação entre os íons do eletrólito e a superfície do eletrodo, armazena-se a energia desejada.
Aplicar tensões mais altas permite armazenar mais energia nos supercapacitores, desde que seus componentes não se degradem frente a essa situação. Por isso, eletrólitos mais estáveis, como os investigados nos trabalhos do CINE, ajudam a aumentar a densidade de energia dos dispositivos.
No primeiro estudo, publicado na revista científica Electrochimica Acta, pesquisadores da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) ligados ao Programa de Ciência Computacional de Materiais e Química do CINE estudaram o desempenho de supercapacitores com eletrólitos de líquidos iônicos (sais que são líquidos em temperatura ambiente). A pesquisa foi realizada durante o mestrado de Pedro Henrique de Lima Ferreira e o doutorado de Abner Massari Sampaio, ambos sob orientação do professor Leonardo Siqueira.
No trabalho, os autores usaram simulações de dinâmica molecular para avaliar a potência e a densidade energética de supercapacitores formados por eletrólitos de líquidos iônicos e eletrodos porosos, que oferecem maior capacidade de armazenar cargas graças à sua grande área superficial. Eles exploraram as possibilidades com dois líquidos iônicos diferentes, tanto puros quanto misturados em diferentes proporções, e com eletrodos porosos e não porosos.
“Mostramos que supercapacitores contendo líquidos iônicos e eletrodos porosos com poros uniformes de 1 nanômetro poderiam armazenar quase a mesma quantidade de energia que uma bateria de íon lítio, como aquelas que estão em nossos notebooks e celulares”, diz o professor Siqueira.
Água e sal
A segunda pesquisa, realizada no âmbito do Programa Armazenamento Avançado de Energia do CINE, investigou supercapacitores com eletrólitos formados por água extremamente salgada, conhecidos como eletrólitos de água em sal.
Eletrólitos baseados em água despertam grande interesse porque são mais baratos e seguros para as pessoas e para o meio ambiente do que os baseados em solventes orgânicos, que são compostos potencialmente inflamáveis e tóxicos. Entretanto, a aplicação de altas tensões em soluções aquosas gera a quebra da molécula de água.
“Nos eletrólitos de água em sal, o sal em demasia bloqueia essa quebra. Assim consegue-se trabalhar com tensões mais altas e ampliar a energia que fica armazenada no dispositivo”, explica o professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Hudson Zanin, um dos autores principais da pesquisa, realizada durante o mestrado de João Pedro Aguiar dos Santos, com a participação do doutorando Manuel Jonathan Pinzón Cárdenas. O trabalho foi reportado no Journal of Energy Chemistry.
O artigo apresenta o primeiro estudo abrangente de supercapacitores de água em sal em temperaturas menores que 0 °C. Usando técnicas in situ (aquelas que utilizam o próprio supercapacitor como amostra) e in operando (as que analisam o dispositivo enquanto está funcionando), os autores investigaram os efeitos da diminuição de temperatura nas propriedades do eletrólito e concluíram que, a -10 °C, a energia do supercapacitor aumenta significativamente.
Dessa forma, o supercapacitor de água em sal atingiu uma densidade energética semelhante à das baterias, com a vantagem de ter alta potência. “Tudo que a gente quer hoje é um dispositivo que carregue muito rápido e armazene muita energia”, comenta Zanin, que é pesquisador no CINE – um Centro de Pesquisa em Engenharia (CPE) constituído por FAPESP e Shell.
Os trabalhos do centro sobre supercapacitores abrem possibilidades dentro do desafio de desenvolver dispositivos que atendam a demanda crescente de armazenar eletricidade proveniente de fontes renováveis como a luz do sol e o vento, que são intermitentes, utilizando materiais que sejam ambientalmente amigáveis e que estejam na cadeia de produção da indústria brasileira.
O artigo Energy and power performances of binary mixtures of ionic liquids in planar and porous electrodes by molecular dynamics simulations pode ser lido em: https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0013468622001542?via%3Dihub.
E o estudo Boosting energy-storage capability in carbon-based supercapacitors using low-temperature water-in-salt electrolytes pode ser acessado em: www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S2095495622001243?via%3Dihub.
* Com informações da Assessoria de Imprensa do CINE.