Seções do tecido adiposo marrom de camundongos mantidos em termoneutralidade ou frio por 14 dias, revelando remodelação tecidual em diferentes temperaturas (imagem: Osvaldo Rodrigues Pereira Júnior et al./American Journal of Physiology-Cell Physiology)
Publicado em 14/10/2025
Agência FAPESP * – Um estudo conduzido por pesquisadores do Centro de Processos Redox em Biomedicina (Redoxoma) mostrou que os canais mitocondriais de potássio sensíveis ao ATP (MitoKATP) estão envolvidos tanto no desenvolvimento de células de gordura marrom quanto na ativação do desacoplamento mitocondrial nessas células, um processo que dissipa energia na forma de calor.
O Redoxoma é um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPID) financiado pela FAPESP e sediado no Instituto de Química da Universidade de São Paulo (IQ-USP).
“Descobrimos que, para que a célula de gordura marrom produza calor de forma eficiente, o canal mitocondrial de potássio precisa estar fechado”, explica Osvaldo Rodrigues Pereira Júnior, pesquisador do Redoxoma. “É a primeira vez que esse fenômeno é reportado, revelando um componente até então desconhecido da ativação termogênica.”
O tecido adiposo marrom, também conhecido como gordura marrom, é um dos principais responsáveis por manter a temperatura corporal em mamíferos, produzindo calor por meio de um processo chamado termogênese sem tremores. Para isso, consome grande quantidade de energia, o que o torna um alvo promissor para estratégias terapêuticas contra a obesidade. Compreender como a gordura marrom é ativada pode abrir caminho para novas formas de regular o gasto energético e promover a saúde metabólica.
O estudo foi desenvolvido durante o mestrado de Pereira Júnior, no Laboratório de Metabolismo Energético do IQ-USP, com bolsa da FAPESP, sob orientação da professora Alicia Kowaltowski, do IQ.
A pesquisa foi publicada no American Journal of Physiology-Cell Physiology.
Ativação termogênica
O trabalho mostrou que, em camundongos, a exposição ao frio e a estimulação adrenérgica, isto é, a ação de hormônios típicos da resposta ao frio e ao estresse, modulam os níveis do canal MitoKATP no tecido adiposo marrom.
Para entender melhor a função desse canal, os pesquisadores removeram o gene que codifica uma subunidade essencial do MitoKATP em pré-adipócitos humanos, que são células precursoras do tecido adiposo. Com isso, observaram uma queda no consumo de oxigênio, redução da proliferação celular e dificuldade na diferenciação desses precursores em adipócitos maduros. Em linhagens de células de camundongos, a ausência da mesma proteína comprometeu a respiração celular no estágio precursor, mas não nas células já diferenciadas.
O dado mais surpreendente, no entanto, veio dos adipócitos maduros. Ao inibir o canal MitoKATP, os pesquisadores viram o consumo de oxigênio aumentar quando as células eram estimuladas, o que sugere que o fechamento do canal é necessário para que a termogênese do tecido adiposo marrom atinja sua máxima eficiência.
Essa observação se confirmou também em mitocôndrias isoladas de camundongos tratados com um composto que ativa receptores adrenérgicos específicos da gordura marrom. Nessas condições, a inibição do MitoKATP também aumentou o consumo de oxigênio ligado à termogênese.
Para Kowaltowski, os resultados do estudo apontam para duas evidências complementares da importância do fechamento do canal MitoKATP na ativação da termogênese. “Além de observarmos que as células com o canal fechado geram mais calor, também vimos que, em animais numa condição que estimula a produção de calor, os canais se encontravam mais fechados”, comenta a professora.
Ela destaca que esses dois achados convergem para a mesma conclusão: “Ao mesmo tempo que o tecido está sendo ativado para gerar calor, o canal se fecha. Isso indica que existe algum tipo de sinalização dentro da célula que leva a essa situação ideal para a geração de calor. São duas maneiras diferentes que demonstram a importância de fechar esse canal para gerar o calor máximo”.
O artigo Mitochondrial ATP-sensitive K+ channels (MitoKATP) regulate brown adipocyte differentiation and metabolism pode ser lido em: journals.physiology.org/doi/full/10.1152/ajpcell.00070.2025.
* Com informações de Maria Celia Wider, do Redoxoma.