Da esquerda para a direita, Lorna Inniss (chefe da subcomissão regional da Comissão Oceanográfica Intergovernamental da Unesco), Megha Sud (ISC), Patrícia Suárez (Fundação Gaia Amazonas e Instituto Interamericano de Pesquisa sobre Mudanças Globais), Paulo Gadelha (Fiocruz) e Alexander Turra (PROASA-FAPESP/IO-USP) (foto: Elton Alisson/Agência FAPESP)
Publicado em 12/11/2025
Elton Alisson, de Belém | Agência FAPESP – Nos últimos 30 anos, nas negociações climáticas internacionais, os elementos fundamentais para manter a vida na Terra, como o clima, o solo, os rios, o oceano e as pessoas, foram tratados isoladamente, avalia Patrícia Suárez, integrante da Fundação Gaia Amazonas, organização que representa 64 comunidades indígenas, e membro do Instituto Interamericano de Pesquisa sobre Mudanças Globais.
Para reconectar esses elementos fragmentados, para que se tenha uma visão geral da complexidade dos impactos das mudanças climáticas globais e se implementem estratégias de mitigação e adaptação de forma igualmente integrada, será preciso, cada vez mais, a interlocução do conhecimento científico com o dos povos tradicionais, sublinhou a representante de povos indígenas da Amazônia colombiana em palestra ontem (12/11) no Pavilhão do Oceano, na 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP30).
Promovido pelo Programa FAPESP para o Oceano Atlântico Sul e Antártica (PROASA), o painel reuniu representantes de instituições de relevância global para compartilhar os desafios e as estratégias para promover a ciência necessária para a preservação das funções dos oceanos.
“A chuva que cai na Amazônia começa no oceano. Também os rios que nós, povos indígenas, ajudamos a preservar, fluem e retornam ao oceano. Por isso, é importante que, ao pensarmos em soluções para conservação do oceano, consideremos a conexão entre a ciência e outros sistemas de conhecimento, incluindo o indígena, porque temos uma conexão direta com a natureza. Observamos, compreendemos e vivemos a natureza e, se essa condição for rompida, criará condições desastrosas”, avaliou.
“Como povos indígenas, estamos prontos para colaborar com os cientistas e outras partes interessadas para promover rios e oceanos saudáveis”, afirmou Suárez. A instituição que ela representa foi criada exatamente com o objetivo de conectar a ciência, as políticas públicas e o conhecimento dos povos tradicionais na pesquisa sobre mudanças climáticas.
Essa integração entre o conhecimento científico e o saber de populações tradicionais é fundamental para o avanço da pesquisa oceânica, avaliou Alexander Turra, professor do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (IO-USP) e coordenador do PROASA.
“Como cientistas, temos um papel muito importante na integração desse conhecimento fragmentado, porque a maneira como nos comunicamos contribui para manter essa fragmentação. Precisamos estar cientes disso e trabalhar de forma a reunir melhor as informações e ter essa visão integrada. Há uma preocupação no próprio PROASA de que as pesquisas científicas se baseiem em princípios, como o da construção e criação conjunta com comunidades e povos tradicionais, e no reconhecimento de diferentes sistemas de conhecimento”, afirmou.
Ciência mais transdisciplinar
Na avaliação de Megha Sud, diretora científica do Conselho Internacional de Ciência (ISC, na sigla em inglês), assim como as florestas, os oceanos também desempenham um papel importante na regulação do clima e formam um ecossistema global. Assim, é mandatório que a pesquisa oceânica seja transdisciplinar.
“A ciência precisa responder à complexidade do oceano deixando de analisá-lo por meio de projetos de curto prazo e isolados ou abordando questões desvinculadas de outros problemas que estão interconectados”, avaliou.
“Precisamos de mais ciência transdisciplinar, que defina problemas em conjunto com diversas partes interessadas, como comunidades locais, governos e formuladores de políticas, e que também cocrie e implemente soluções em conjunto”, apontou.
Uma das estratégias para tornar a pesquisa sobre o oceano mais integrada e transdisciplinar é promover projetos de alfabetização oceânica e de ciência cidadã, apontou Lorna Inniss, chefe da subcomissão regional da Comissão Oceanográfica Intergovernamental da Unesco.
Por meio de uma parceria com a Rede de Observação Pesqueira, o órgão que apoia 29 estados-membros que fazem fronteira com o mar do Caribe e o Golfo do México, incluindo o Brasil, instalará instrumentos de baixo custo nas laterais de barcos de pesca para coleta de dados oceânicos.
“À medida que os barcos se deslocarem pela água, eles contribuirão para aprimorar as observações oceânicas, fornecendo desde variáveis simples e essenciais até novos dados necessários para melhorar a previsão de furacões, por exemplo, ou de locais onde é possível pescar. Treinaremos os pescadores para usar os dados e as informações que irão coletar”, contou.
Outra estratégia para estimular a sensibilização da sociedade para a conservação dos oceanos é mostrar sua importância para a saúde pública, avaliou Paulo Gadelha, pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
Algumas constatações que emergiram nas últimas COPs é que as mudanças climáticas podem conduzir a uma crise na saúde. Por isso, a saúde poderia ser um dos principais argumentos para promover o conhecimento e a conscientização pública sobre a emergência das mudanças climáticas. “Trazer a questão da saúde pode ampliar a perspectiva e abrir novas formas de valorização do oceano”, indicou.