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Meta de limitar aquecimento a 1,5 °C não pode ser abandonada


Meta de limitar aquecimento a 1,5 °C não pode ser abandonada

Chris Fields, da Universidade Stanford, Thelma Krug, do Conselho Superior da FAPESP, e Johan Rockström, diretor do Instituto Potsdam para Pesquisa sobre Impacto Climático (foto: Elton Alisson/Agência FAPESP)

Publicado em 11/11/2025

COP30

Elton Alisson, de Belém | Agência FAPESP – Mesmo que seja ultrapassada, a meta de limitar o aumento da temperatura média global a 1,5 °C acima dos níveis pré-industriais – considerada o ponto máximo para evitar os piores cenários climáticos – não deve deixar de ser perseguida e tem de ser o ponto de partida nas negociações na 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP30).

A avaliação é de um grupo de 11 renomados cientistas climáticos, dos quais seis são do Brasil e cinco oriundos da África do Sul, Estados Unidos, Alemanha, China e Inglaterra, que integram um Conselho Científico estabelecido como órgão consultivo pela presidência da COP30.

O conselho é presidido por Thelma Krug, integrante do Conselho Superior da FAPESP, e conta com a participação, do lado do Brasil, de Paulo Artaxo, professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (IF-USP) e membro da coordenação do Programa FAPESP de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas Globais (PFPMCG); Carlos Nobre, pesquisador sênior do Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP e copresidente do Painel Científico para a Amazônia; Ima Vieira, pesquisadora do Museu Paraense Emílio Goeldi; Tatiana Sá, pesquisadora da Embrapa Amazônia Oriental; Moacyr Araújo, professor e vice-reitor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE); e Marina Hirota, do Instituto Serrapilheira.

“Uma das mensagens centrais básicas é que 1,5 °C [de limite de aquecimento global] não é apenas uma meta ou objetivo. É algo que precisamos levar a sério e devemos manter como o ponto de partida e o limite que as negociações sempre devem visar”, disse Johan Rockström, diretor do Instituto Potsdam para Pesquisa sobre Impacto Climático, da Alemanha, e um dos membros estrangeiros do conselho, durante o primeiro evento público do grupo na COP30.

De acordo com Krug, um dos objetivos do conselho é prover dados científicos para subsidiar a presidência da COP. “A primeira pergunta que nos fizeram foi se ainda é viável manter o limite do aquecimento global a 1,5 °C. A partir dessa pergunta surgiu uma série de outras questões que tiveram que ser abordadas como parte da resposta a essa indagação”, contou.

Quando o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês) começou a publicar seus primeiros relatórios, em 1990, a avaliação na época era de que até 5 °C ou 6 °C de aquecimento global não teriam risco de causar mudanças irreversíveis no sistema climático. À medida que o conhecimento foi avançando, e a cada avaliação subsequente, a faixa de temperatura de risco diminuiu cada vez mais, situando-se entre 1,5 °C e 2 °C no sexto e último relatório publicado pelo Painel, em 2022, relembrou Rockström.

“Isso demonstra que, quanto mais aprendemos sobre o funcionamento do sistema terrestre e sobre os impactos do aquecimento global, vemos que maior é o problema de ele causar danos à capacidade de suporte à vida. Concluímos que 1,5 °C é um nível muito sério de aumento da temperatura global além do qual temos ampla evidência de que as pessoas em todo o mundo sofrerão com a sequência de eventos extremos e também corremos o risco de nos aproximarmos de pontos de mudanças irreversíveis no funcionamento do sistema terrestre”, afirmou.

As novas evidências científicas também indicam, com alta probabilidade, que o limite de 1,5 °C de aquecimento será atingido nos próximos cinco a dez anos, devido à sobrecarga do sistema terrestre com as emissões cumulativas de gases de efeito estufa, como o dióxido de carbono (CO2), apontou Rockström.

“A ciência mostra que ainda podemos limitar esse excesso e retornar a 1,5 °C. O melhor cenário indica que podemos retornar a esse patamar ainda neste século, mas que, infelizmente, temos um período de sobreaquecimento de 50 a 60 anos ainda neste século, em algum ponto entre 1,6 °C e 1,7 °C, antes de reverter essa tendência”, disse.

Esses cenários climáticos, contudo, são muito otimistas e partem do pressuposto de que os países serão capazes de reduzir as emissões globais de carbono ainda este ano ou no próximo e avançar rapidamente rumo a uma economia mundial com emissões líquidas zeradas em 25 anos, pondera Rockström. Isso também dependerá de o mundo ser capaz de promover a transição do sistema terrestre de fonte para sumidouro, de não ultrapassar nenhum ponto de inflexão na capacidade de a biosfera absorver carbono e de que o oceano continue estável, absorvendo 90% do calor e 25% de CO2, sublinhou o cientista.

“Isso representa uma aposta em um sistema terrestre resiliente e uma orientação muito importante para os negociadores de que precisamos levar a sério a implementação de medidas de mitigação”, afirmou. “A mensagem que transmitimos à presidência da COP é que, queiramos ou não, precisamos aumentar seriamente a escala de remoção de dióxido de carbono. Precisamos agir simultaneamente em todas as frentes, como mitigação, meio ambiente, agricultura e remoção de dióxido de carbono, para termos uma chance de minimizar a ultrapassagem de 1,5 °C de aquecimento”, disse.

Uso com moderação

A despeito de serem promissoras, as soluções para remoção de dióxido de carbono (CDR) disponíveis hoje são lentas, caras e causam uma ampla gama de consequências intencionais e não intencionais, ponderou Chris Fields, professor da Universidade Stanford, dos Estados Unidos, e um dos membros internacionais do Conselho Científico.

“Quando se utilizam restauração e reflorestamento como soluções de CDR, podem gerar uma ampla gama de benefícios; mas, quando empregamos técnicas industriais para capturar CO2 do ar ou formações geológicas regenerativas, pode não funcionar”, afirmou Fields.

Segundo o cientista norte-americano, existem diversas tecnologias que estão sendo discutidas hoje para remoção de CO2 atmosférico, além do restauro e do reflorestamento. Entre elas estão a captura de CO2 do ar e sua injeção no solo para formar rochas sedimentares e a fertilização de oceanos, que podem causar mudanças na composição biológica e química de ecossistemas marinhos.

“Há dezenas de opções de CDR, mas podemos afirmar que, no contexto atual, a restauração florestal tende a ser a opção mais barata, com muitas espécies disponíveis a um custo de US$ 50 por tonelada ou menos. Os processos industriais, por sua vez, tendem a ser os mais caros, com custo atual de US$ 200 por tonelada ou um pouco menos”, comparou Fields.

O reflorestamento também é a maneira mais fácil de começar a implementar iniciativas de CDR porque já existem experiências bem-sucedidas no mundo, incluindo no Brasil, mas ainda em pequena escala, ponderou Krug.

“Precisamos de compromissos muito mais ambiciosos e de uma transição energética muito mais rápida, porque muitas partes do mundo já se comprometeram com o desmatamento zero. Por isso, o que precisamos, agora, é de um compromisso com a transição energética e sermos muito claros quanto à redução e eliminação gradual [dos combustíveis fósseis]. Tenho esperança de que isso vai acontecer”, afirmou a cientista.
 

Fonte: https://agencia.fapesp.br/56438