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Novo programa deverá promover governança do oceano e aproveitar potencial para a economia azul


Novo programa deverá promover governança do oceano e aproveitar potencial para a economia azul

A mesa de abertura reuniu Gilles Pinay (CNRS), Viviana Alder (Universidade de Buenos Aires), César de Castro Martins (IO-USP), Cristiana Seixas (Unicamp) e Jerome Fort (CNRS) (foto: Daniel Antônio/Agência FAPESP)

Publicado em 04/04/2024

André Julião | Agência FAPESP – O Atlântico Sul e a Antártida são estratégicos para avaliar uma série de questões ambientais e sociais. No entanto, há muito mais estudos e dados disponibilizados sobre o Atlântico Norte.

Equalizar essa disponibilidade de dados é um dos desafios do Programa para o Atlântico Sul e a Antártida (PROASA), lançado pela FAPESP em evento realizado nesta terça (02/04) e quarta-feira (03/04). O programa tem como parceiros iniciais a Argentina e a França (leia mais em: agencia.fapesp.br/51295/).

“São necessários pontos de monitoramento de longo prazo em locais sentinela no Atlântico Sul, que requerem infraestrutura física e capacidade [para operar os instrumentos]”, exemplificou César de Castro Martins, professor do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (IO-USP), durante a abertura do segundo dia de evento.

Essa é apenas uma das informações necessárias para que se tenha um oceano resiliente. Segundo Cristiana Simão Seixas, pesquisadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais da Universidade Estadual de Campinas (Nepam-Unicamp), o programa de pesquisas deve levar em conta que o oceano é um sistema sócioecológico, que exige boa governança e o engajamento de múltiplos atores na construção ou mesmo na coprodução de conhecimento para a tomada de decisões.


Cristiana Simão Seixas, da Unicamp (foto: Daniel Antônio/Agência FAPESP)

“É preciso que se faça as coisas de forma diferente, saindo de nossas zonas de conforto e expandindo nossas visões”, pontuou Seixas, uma das organizadoras do livro Governança, Conservação e Desenvolvimento em Territórios Marinhos-Costeiros no Brasil.

Para Viviana Alder, pesquisadora do Instituto Antártico Argentino e professora da Universidade de Buenos Aires, o estudo da Antártida é uma grande oportunidade, uma vez que é um exemplo de governança e de cooperação internacional bem-sucedida, em uma região sem igual para o entendimento de processos e do funcionamento de ecossistemas e, portanto, ideal para repensar medidas de ação e gerar soluções inovadoras.

“Numa escala global, é a região menos poluída, com menos de 1% da área afetada, e com espécies invasoras sob controle. Ao mesmo tempo, em 2023 o gelo marinho atingiu os níveis mais baixos já registrados. Isso tem implicações críticas para o clima global”, afirmou.

Economia azul

Wagner Valenti, professor do Centro de Aquicultura da Universidade Estadual Paulista (Caunesp), lembrou que a chamada economia azul, que abrange as atividades que envolvem o oceano, movimentou US$ 1,5 trilhão em 2022. Ao mesmo tempo, apenas 1,7% dos gastos em pesquisa no mundo são relacionados a assuntos marinhos.

“No Brasil, essa proporção é 60 vezes menor. Estamos atrás de outros países e precisamos prestar atenção à economia azul”, alertou.

Um dos exemplos de potencial econômico para o Brasil, citado pelo pesquisador, são os compostos bioativos presentes em organismos marinhos, que têm a possibilidade de serem usados pelas indústrias farmacêutica e de cosméticos, para mencionar apenas duas. Alguns desses organismos podem ser capturados durante a pesca de espécies de interesse comercial.

“Cada quilo de camarão pescado, por exemplo, gera dez quilos de peixes e invertebrados que morrem e são descartados no oceano. Um grande desperdício. É uma grande quantidade de biomassa da qual podem ser extraídas biomoléculas”, exemplificou.

Luiz Felipe Domingues Passero, professor do Instituto de Biociências da Unesp, Câmpus do Litoral Paulista, apresentou seus estudos explorando justamente esse potencial.

Seu grupo isolou um novo composto de uma alga (Cystoseira baccata), que se mostrou bastante ativo contra o parasita causador da leishmaniose sem ser tóxico para as células humanas.

Outra alga estudada (Laurencia aldingensis) contém pelo menos três compostos promissores contra glioblastomas, um tipo de tumor no cérebro, em uma dose muito menor do que a droga mais utilizada no tratamento disponível.

“Apesar de a Antártida ser um ambiente biodiverso, poucos estudos foram produzidos ao longo dos anos sobre a sua diversidade molecular. O clima extremo [da região] pode pôr os organismos sob pressão, o que pode trazer classes especiais de compostos”, ressaltou.

Colaborações

No encerramento, o presidente da FAPESP, Marco Antonio Zago, lembrou que o novo programa reforça e amplia os laços do Estado de São Paulo e do Brasil com a França.

“Estou certo de que a nossa conferência alcançou seus objetivos, que eram principalmente reforçar a colaboração já existente, assim como forjar novas alianças. Foi um forte pontapé inicial e agora começamos a trabalhar juntos”, afirmou.

Alexander Turra, professor do IO-USP e coordenador do PROASA, lembrou que o Brasil está construindo parcerias com a França em diferentes áreas há um longo tempo.

“Essa parceria vai além da ciência, mas deve ser enraizada nela. Ano que vem teremos o ano bilateral Brasil-França, em que vamos fazer coisas importantes juntos. Mas será também o Ano dos Oceanos na França e, no meio de 2025, teremos a Conferência dos Oceanos, em Nice. No fim do ano [que vem] teremos a COP30 em Belém, no Brasil”, lembrou.

O embaixador da França no Brasil, Emmanuel Lenain, declarou que o lançamento do novo programa “é uma grande iniciativa para proteger a ciência antártica e reforçar a agenda do oceano na região” e que os temas das mudanças climáticas e da proteção da biodiversidade foram questões centrais no encontro entre os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Emmanuel Macron na semana anterior.


Yves d'Orfeuil, cônsul geral da França em São Paulo; Emmanuel Lenain, embaixador da França no Brasil; Marco Antonio Zago, presidente da FAPESP; e Alexander Turra, coordenador do PROASA (foto: Daniel Antônio/Agência FAPESP)
 

Fonte: https://agencia.fapesp.br/51305