Conclusão é de estudo com mais de 1,6 mil participantes de todo o Brasil. Trabalho foi premiado em concurso promovido pela Capes (foto: Md Azam/Pixabay)
Publicado em 30/08/2022
Agência FAPESP* – No começo da pandemia da COVID-19, em 2020, a modalidade remota exigiu reorganização rápida na relação trabalho-família. Uma pesquisa sobre o tema conduzida na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) foi premiada em um concurso nacional de artigos científicos promovido pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).
A pesquisa que deu origem ao artigo vencedor integra o projeto de doutorado de Marcela Alves Andrade, estudante no Programa de Pós-Graduação em Fisioterapia da UFSCar e bolsista da FAPESP, sob orientação de Tatiana Sato, docente no Departamento de Fisioterapia.
Andrade participou do Concurso de Artigos Científicos da Capes sobre “Fortalecimento de vínculos familiares em tempos de pandemia”. Ela ficou em segundo lugar na categoria “Estratégias de equilíbrio trabalho-família no contexto do isolamento social”.
O trabalho mostra que profissionais do setor de educação foram os que enfrentaram mais dificuldades na relação trabalho-família no início da pandemia. E, no outro extremo, estão as pessoas com mais de 60 anos.
A pesquisa, que teve início em 2020, faz parte do estudo “Implicações da pandemia de COVID-19 nos aspectos psicossociais e capacidade para o trabalho em trabalhadores brasileiros - estudo longitudinal (IMPPAC)". O objetivo central é avaliar aspectos psicossociais e a capacidade para o trabalho em profissionais de vários setores econômicos, com acompanhamento longitudinal durante 12 meses.
Foram aplicados questionários on-line a 1.698 trabalhadores, dentre os quais o Copenhagen Psychosocial Questionnaire (COPSOQ II-Br), desenvolvido na Dinamarca, traduzido e adaptado para o português brasileiro pelo grupo liderado pela professora Sato.
O instrumento abrange uma série de aspectos, dentre os quais o conflito entre trabalho e família, tema do concurso de artigos científicos. "A partir do artigo, pudemos explorar esse aspecto de forma mais aprofundada", explica Sato.
“Nós tivemos de modificar nossa forma de trabalhar e de se relacionar com o trabalho e com a família dentro de casa. Foi tudo muito brusco, inesperado e imprevisível. Então, esse tema é muito relevante e interessante”, destaca a professora.
Nesse contexto, o estudo identificou que o conflito foi menor em pessoas acima dos 60 anos, “o que atribuímos à maior experiência para lidar com o trabalho e a família e, também, ao fato de que os trabalhadores com mais idade podem ter tido redução da carga de trabalho na pandemia por comporem o grupo de risco”.
Outros pontos importantes destacados na pesquisa referem-se ao trabalho no setor da educação e ao medo de se contaminar no trabalho. Esses fatores, segundo a orientadora da pesquisa, foram associados ao conflito entre trabalho e família: “Sabemos que os professores foram altamente impactados pelo ensino remoto, o que gerou aumento das demandas de trabalho e da chance de conflitos com a vida familiar”.
Em relação ao medo de contaminação, a professora relata que, no início da pandemia, havia muito medo de que os familiares pudessem ser contaminados e, em decorrência dessa insegurança, muitos profissionais relataram durante a pesquisa que seus familiares desejavam que eles deixassem suas profissões, principalmente os da área da saúde, ou mudassem de emprego, mesmo que momentaneamente, para que o risco fosse minimizado. "Assim, o estresse emocional e psicológico devido ao medo da contaminação pode ter ocasionado conflitos entre diferentes membros da família", salienta a pesquisadora.
Conflito trabalho-família
A docente aponta, no entanto, que algumas hipóteses iniciais do estudo não foram confirmadas. Uma delas relaciona-se à parentalidade, isto é, ao pressuposto que a presença de filhos estaria associada ao conflito trabalho-família. “Discutimos esse aspecto compreendendo que filhos geram demandas, mas também podem ter contribuído para melhorar as relações entre o trabalho e a família, uma vez que os trabalhadores com filhos tiveram mais momentos de distração familiar e, assim, conseguiram gerenciar melhor o desgaste provocado pelo confinamento”, expõe Sato.
Outra expectativa do estudo era que as mulheres tivessem maior chance de conflito entre trabalho e família, por conta das demandas com os afazeres domésticos e de cuidado familiar, o que também não se confirmou.
O estudo mostrou ainda que o convívio social é importante para o bem-estar individual e coletivo e que nem todos os trabalhadores conseguem conciliar a demanda do trabalho e da família de forma positiva. “O retorno às atividades presenciais e as redes de apoio podem auxiliar nesse processo. É fundamental que as famílias fiquem atentas às modificações de comportamentos, busquem separar as atividades de trabalho das atividades com a família e se prestem mais ao lazer dentro e fora do ambiente familiar”, recomenda Sato.
* Com informações da Coordenadoria de Comunicação Social da UFSCar.