Antonio Mauro Saraiva (USP); Ignacio Belda Aguilar (UCM); Miguel Berdugo (UCM); Barbara Janet Teruel Medeiros (Unicamp); Pablo Garcia Palacios (ICA); Rouverson Pereira da Silva (Unesp); José Alexandre Melo Demattê (USP) e Irene Borra (ICA-CSIC) (foto: Elton Alisson/Agência FAPESP)
Publicado em 29/11/2024
Elton Alisson, de Madri | Agência FAPESP – Os produtores de amendoim (Arachis hypogaea L.), batata (Solanum tuberosum) e batata-doce (lpomoea batatas) enfrentam o desafio de estimar qual o melhor momento da colheita e como será a qualidade e o rendimento de suas lavouras. Isso porque essas culturas são subterrâneas, ou seja, os frutos se desenvolvem embaixo do solo e, dessa forma, não é possível visualizá-los até o momento da colheita.
“Para colher o amendoim, é preciso que 70% das vagens estejam maduras e, para verificar isso, é preciso arrancar as plantas do solo e fazer uma avaliação visual. Essa operação, chamada de arranquio, também acaba mobilizando a terra e, consequentemente, emitindo CO2 [gás carbônico]", explicou Rouverson Pereira da Silva, professor da Universidade Estadual Paulista (Unesp), campus de Jaboticabal.
Por meio de tecnologias de sensoriamento remoto, baseadas em imagens obtidas por satélites ou sensores embarcados em drones, combinadas com sensores embarcados em máquinas agrícolas e ferramentas de inteligência artificial, os pesquisadores têm desenvolvido modelos computacionais que podem auxiliar os produtores a mensurar o rendimento e a maturidade de culturas, como a do amendoim, a partir da análise remota das folhas da planta. E, dessa forma, aumentar a produtividade e diminuir as emissões de CO2 pela mobilização intensa do solo.
Alguns dos resultados do projeto, apoiado pela FAPESP, foram apresentados por Silva em um painel sobre saúde do solo no contexto da agricultura digital realizado durante a FAPESP Week Spain, que ocorreu nos dias 27 e 28 de novembro na Faculdade de Medicina da Universidade Complutense de Madri (UCM).
“Os modelos que desenvolvemos conseguem estimar com mais de 90% de precisão a maturidade do amendoim, por exemplo, eliminando a necessidade do arranquio. No caso da batata-doce, conseguimos estimar até mesmo o tamanho da cultura”, disse Santos à Agência FAPESP.
“Por meio de estimativas feitas por esses modelos computacionais é possível trabalhar com regulagens mais adequadas para melhorar a eficiência do processo de colheita e, ao mesmo tempo, reduzir as perdas, porque ao estimar a produtividade de culturas se consegue regular as máquinas agrícolas para fazer a colheita de forma mais adequada”, afirmou o pesquisador.
Para obter essas estimativas com precisão, os pesquisadores analisam imagens obtidas por câmeras embarcadas em drones ou em satélites, que captam a reflectância da planta, ou seja, o quanto ela está refletindo de energia solar nas bandas do visível (verde, amarelo e azul) e do invisível (infravermelho, infravermelho próximo e borda do vermelho). A partir dessa característica, é possível calcular os índices de maturação.
“A reflectância revela a sanidade da planta. As folhas doentes apresentam cores e refletem de maneira diferente a energia solar incidida sobre elas. E, quanto mais saudável a planta estiver, mais produzirá”, contou Silva.
O projeto está em fase de transferência de tecnologia para os produtores – um processo moroso e trabalhoso, segundo o pesquisador.
“Essa etapa é demorada porque, para realizarmos um projeto dessa envergadura, precisamos ir a campo e arrancar milhares de plantas ao longo dos anos para obter os dados de interesse. Além disso, há diversas cultivares de amendoim, por exemplo. Por isso ainda não transferimos a tecnologia, porque os produtores mudam ao longo dos anos as cultivares que plantam e precisamos ter um modelo robusto, capaz de fazer predições em diferentes condições”, explicou.
Economia de água
Já um grupo de pesquisadores da Faculdade de Engenharia Agrícola da Universidade Estadual de Campinas (Feagri-Unicamp) tem utilizado um sistema de radar miniaturizado embarcado em drones para elaborar mapas de umidade de solo de plantações como a de cana-de-açúcar.
Por meio de um projeto também financiado pela FAPESP, no âmbito de um acordo com a IBM Brasil, os cientistas desenvolveram uma tecnologia que, a partir da interação das ondas de frequência emitidas por esse sistema de radar em três bandas diferentes, que não só tocam, como penetram o solo, possibilita estimar a quantidade de água disponível em diferentes parcelas de uma lavoura.
O projeto resultou na criação de uma startup, a Radaz, apoiada pelo Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE) (leia mais em: pesquisaparainovacao.fapesp.br/1864).
“A precisão do sistema para estimar a umidade relativa de uma parcela de solo monitorada é maior do que 90%”, contou à Agência FAPESP Barbara Janet Teruel Medeiros, professora da Feagri e integrante do projeto.
O desenvolvimento do sistema envolveu a experimentação em campo, a validação com métodos tradicionais e os testes em plantações de cana-de-açúcar no Estado de São Paulo. “Pudemos prever com bastante antecedência a produtividade dessa cultura em termos da quantidade de biomassa que seria produzida quando chegasse a ponto de maturidade, bem como qual seria a melhor data para a colheita”, disse Medeiros.
Segundo a pesquisadora, o nível de umidade do solo não é homogêneo, bem como o de porosidade e escoamento de água. Nesse sentido, ao estimar a umidade do solo de uma plantação, é possível implementar sistemas de irrigação com taxa variável, resultando em maior economia de água.
“Dessa forma não seria mais preciso abrir o sistema de irrigação para escoar uma quantidade de água desnecessária. Seria possível ajustá-lo para liberar o tanto ideal para uma determinada parcela do solo, evitando saturar certas regiões ou deixar faltar em outras que estão com níveis abaixo do necessário para o crescimento da cultura”, explicou.
Os objetivos são semelhantes aos de dois projetos iniciados recentemente na Europa, com a participação de pesquisadores do Instituto de Ciências Agrárias do Conselho Superior de Investigações Científicas (ICA-CSIC).
O primeiro, chamado projeto DATI, que envolve, além de pesquisadores da Espanha, também da Itália, Marrocos, Portugal e França, pretende estimular o desenvolvimento de novas soluções tecnológicas no domínio da agricultura digital por meio da utilização de drones, imagens de satélite e estações agrometeorológicas para reduzir entre 15% e 20% o consumo de água em comparação com o sistema de irrigação tradicional.
Já o projeto Earth Observation for Water Use Efficiency, capitaneado pelo Conselho Superior de Investigações Científicas (CSIC), da Espanha, pretende fornecer ferramentas baseadas na observação da Terra para a avaliação e gestão da eficiência e produtividade do uso da água em pastagens e culturas de cereais no Mediterrâneo.
“É preciso fornecer soluções para a agricultura de precisão, pois estamos cientes de que o solo não é homogêneo e as plantas não se desenvolvem de uma mesma forma por toda a superfície. Por isso, não podemos administrar toda uma área da mesma maneira. A ideia é dividi-la por zonas, para que possamos realmente fazer um tratamento ou gerenciamento específico do local”, disse Irene Borra, pesquisadora do ICA.
Os pesquisadores espanhóis estão realizando um estudo em que pretendem, por meio de análises de imagens obtidas por veículos aéreos não tripulados e métricas baseadas em evapotranspiração (perda de água do solo por evaporação e da planta pela respiração), aumentar a precisão na detecção de estresse hídrico (falta de água) em videiras.
“Estamos elaborando mapas que nos indicam áreas onde está realmente tudo bem com relação à água e outras que precisamos cuidar, pois apresentam estresse hídrico”, contou Borra.
Mais informações sobre a FAPESP Week Spain em: www.fapesp.br/week/2024/spain.